Tributo à Mãe Natureza

Tributo à Mãe Natureza
Pelas águas limpamos nossos corpos e nossas almas; com a água, nossos espíritos se nutrem...

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Capítulo V (parte 2)

Diferentemente de suas outras amantes, a proprietária da casa/estúdio que Alejandro ocupava não se relacionava sexualmente com ele. Seu patrocínio se baseava na certeza de que estava auxiliando um grande artista a compartilhar suas obras com o mundo. Quando o conheceu, em uma de suas viagens à Argentina, ele vendia seus quadros em uma praça de Buenos Aires.


Sophia ficou encantada não somente com as obras, mas também com aqueles olhos verdes muito irônicos, que zombavam dos turistas enquanto seus lábios sorriam e suas palavras soavam doces aos ouvidos mais desavisados.

Por isso, sabia o que estava fazendo quando o trouxe para o Brasil, onde contava com grandes amigos no mundo das artes plásticas. Logo, Alejandro se enturmou com seus pares, e não era raro encontrá-lo bebericando, num final de tarde, num dos muitos barzinhos da Vila Madalena, comentando as exposições mais recentes ou opinando sobre os trabalhos dos muitos amigos que já fizera neste país.

Envolver-se com as mulheres era para ele um jogo divertido, uma verdadeira batalha de sedução – da qual, invariavelmente, elas saíam vencidas. Por isso, Sophia não se preocupava com as muitas conquistas que seu protegido teimava em realizar, apenas pelo prazer de mostrar como as amantes podiam ser dominadas pelos seus desejos.

Enquanto sua pintura não fosse prejudicada, os desvarios de Alejandro com relação às mulheres não constituíam problema para sua protetora. Contudo, ela sempre procurava estar informada sobre a amante do momento. E, quando ele lhe falou de Valéria pela primeira vez, um sinal inconsciente de alarme fez com que Sophia procurasse a ajuda de um vidente, seu amigo de longa data.

Ao relatar a Alfonso a sensação ruim que o nome da moça lhe provocara, pediu que verificasse as energias que a circundavam, porque não gostara do que havia sentido. “Acho que, desta vez, Alejandro pode se complicar de fato ao se envolver com essa Valéria. As vibrações que senti me fizeram arrepiar – foi grande a impressão de desconforto que me acometeu”, explicou Sophia ao amigo.

Por isso, aconselhada pelo vidente, ela preparou alguns banhos com ervas para o artista – que adorava os “banhos de cheiro” que Sophia, às vezes, lhe obrigava a tomar –, assim como cercou o ateliê com pontos magísticos que o protegeram das investidas que o pai-de-santo tentou contra ele para dominar a sua vontade.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Capítulo V (parte 1)

Alejandro já se cansara das cobranças de Valéria. A princípio, o jeito extravagante da garota até que lhe despertara o interesse, e sua fogosidade na cama também estimulava sua paixão por ela. Mas, decorrido bem pouco tempo, seu linguajar chulo – com muita gíria e palavrões – deixou de ser folclórico e passou a ser grosseiro, em sua concepção de artista.

Acostumado a ter a seus pés mulheres ricas, belas e cultas, que lhe custeavam a satisfação de todos os seus desejos, o pintor se questionava por que aquela mulher o atraíra. Contudo, passada a curiosidade inicial – sim, só podia ser isso que o induzira a se tornar seu amante –, a vulgaridade da moça tornou-se incômoda, e ele começou a evitá-la.

Recorrendo mais uma vez aos trabalhos do pai-de-santo, “seo” Jurandir, Valéria teve de escolher, entre os amantes, a quem pretendia “deixar amarrado”, e ela optou por Alejandro, pois o artista estava preparando uma exposição que, segundo seu marchand, seria um sucesso. Para a moça, estava na hora de o pintor devolver-lhe, com juros, o investimento que fizera nele.

Assim, numa manhã em que a sorte sorriu para Alfredo – que se livrava de uma peste, sem nem mesmo dar-se conta disso –, Valéria fez suas malas e carregou tudo o que pôde do apartamento do amante, dirigindo-se ao ateliê de Alejandro. O que ela não esperava, porém, é que fosse encontrá-lo ao lado de Sophia, a proprietária do imóvel que ele ocupava e uma de suas “financiadoras”.

“O que você quer aqui?”, perguntou o artista, ao ver as malas que Valéria carregava. Desconcertada pela presença da outra mulher, ela apenas gaguejou: “Bem... pensei que poderia vir morar com você...”, e mais não disse, intimidada pela gargalhada de Alejandro. Dardejando chispas de ironia com os olhos, ele foi bem sarcástico com ela ao comentar: “E o que lhe deu a idéia de que era isso o que eu queria?”

Dessa vez, foi Valéria quem ficou sem entender nada. “Como a magia do ‘seo’ Jurandir funcionou tão bem com o Alfredo, mas não dobrou a vontade de Alejandro?”, queria saber. O que não desconfiava é que a falta de sentimentos do artista com relação a ela o tornara imune a seus feitiços – bem como a vigilância espiritual que Sophia exercia sobre o rapaz.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Capítulo IV (parte 3)

Com os olhos focados no infinito, Alceu cismava, esquecido do processo que o jovem estagiário havia deixado sobre sua mesa para ser avaliado. Pensava na esposa – considerando que podia chamá-la desse modo, pois o divórcio ainda não fora consumado –, e sentiu saudades.

Todas as tardes, ao chegar em casa, tomava um banho morno a fim de relaxar. Logo a seguir, ia para a sala de tevê, onde Josephine o esperava com um drinque e muito carinho. Sim, pois em tudo que ela lhe fazia havia um toque especial, o cuidado que só se dedica às pessoas que amamos. E ela o amava...

E o que dizer de seus sentimentos? É bem verdade que se entusiasmou com a juventude e beleza de Cláudia, seu interesse por ele, um homem maduro. Mas a ausência de outras qualidades na moça, incluindo a falta de vocabulário para manter uma conversação minimamente inteligente, estava começando a aborrecê-lo.

Passada a animação dos primeiros meses, a convivência com Cláudia estava indo de mal a pior. Sem nenhum preparo para administrar uma casa, ela insistia em continuar trabalhando no escritório, no contato externo com os clientes, deixando a organização do apartamento nas mãos da empregada. E já Alceu acreditava que, se fosse de outro jeito, nem alimentação ou roupa lavada ele teria em casa.

Estranho, mas a verdade é que nunca pensou na nova residência como um lar, sua casa. Guardava esse sentimento para o apartamento agora dividido somente pela mulher e a filha, Cibele. Será que elas sentiam tanto a sua falta como ele a delas?

Quase como respondendo a esses pensamentos, a secretária anunciou a presença de Josephine, que queria lhe falar. Não só pediu que ela entrasse, mas encomendou também café e água para os dois. “Que prazer vê-la aqui, Jô”, recebeu-a à porta de sua sala, sem conter todo seu contentamento. “Há quanto tempo você não nos visita?”, cobrou ele, mostrando um cativante sorriso.

Leda, a recepcionista, que falava com a copa solicitando os cafezinhos, voltou a cabeça em direção ao patrão – e registrou mentalmente a cena, que haveria de reproduzir depois para a amiga Cláudia. “Afinal, se não fosse pela Cláudia, eu não teria conseguido este emprego”, ela lembrou.

Cavalheiro como sempre, Alceu ofereceu o braço à esposa para introduzi-la no escritório e, ao deixá-la próxima ao pequeno sofá onde acomodava os amigos que o visitavam, observou enquanto segurava suas mãos: “Cada dia que passa, você se torna ainda mais bela, minha querida”. E a seguir, com toda a doçura, beijou-lhe as mãos.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Capítulo IV (parte 2)

Quase de forma imperceptível, Sandra sacudiu os ombros para libertar-se daquela lembrança triste, e garantiu a si mesma que não permitiria que fantasmas do passado, ainda que recentes, viessem perturbar a sua existência. Havia prometido à filha, entre lágrimas e risos, que se encontrasse novo amor não se casaria antes de sua aprovação – mas sabia que não desperdiçaria a vida chorando por um homem que não a respeitara.

Durante o tempo em que convivia com os amigos hippies, na comunidade, jamais começara um relacionamento sem terminar o anterior. Desde aquela época, acreditava que ninguém manda nas coisas do coração; porém, isso não impedia que os sentimentos de cada um fossem respeitados. Para Sandra, amor sempre foi reciprocidade, não obrigação.

E os cuidados da designer quanto à sua apresentação pessoal não passaram despercebidos a Paolo Lombardi, presidente da Gioia per Tutti, que havia comprado sua última coleção exclusiva para comercializá-la pelo mundo.

Enquanto isso acontecia na Itália, sozinha em seu apartamento, que lhe parecia tão imenso e escuro sem a radiosa presença da filha, Josephine resolveu que devia deixar de se lamentar e partir para a luta, se quisesse reconquistar o marido. Afinal, o divórcio ainda não fora assinado, e a única arma com que Cláudia contava era sua juventude. E, como lhe confidenciou a sogra, na conversa pelo telefone em que combinavam a ida de Cibele à fazenda, “isso já não está bastando para manter o interesse de Alceu pela moça. Pelo menos, é o que tenho observado nos finais de semana que eles passam aqui”.

Aluna de um dos melhores colégios da capital paulista, Josephine freqüentou a seguir o curso de Educação Artística com Licenciatura Curta e Plena em Habilitação em Música, atendendo ao desejo da mãe de que ela se tornasse professora de piano. Ao comentar a possibilidade de se tornar uma concertista, a mãe fez Josephine “esquecer essa idéia absurda”, que poderia levá-la para longe de casa. E a filha concordou, abandonando o sonho de se tornar uma grande musicista.

O namoro e o casamento com Alceu foram a coroação dos planos maternos – se bem que ela acreditava que, mesmo que os pais não aprovassem, ainda assim teria se casado com ele. A certeza de que o amava, e era correspondida, lhe teria dado forças para lutar por sua decisão.

E foi com essa certeza que Josephine se esmerou para a visita ao escritório do marido, com o pretexto de levar alguns CDs que a filha lhe pediu para enviar à fazenda.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Capítulo IV (parte I)

Absorto com os lançamentos contábeis que estava preparando para apresentar ao patrão, Cássio parou por um instante e, sem querer, soltou um suspiro profundo, como que libertando de dentro do peito aquela sensação doída que aí se instalara depois de ter ajudado o sr. Márcio a levar para dentro da casa a bagagem de sua neta.

Em apenas seis meses, parecia estar diante de uma outra pessoa: Cibele deixara de ser uma adolescente e se transformara numa bela mulher. Acompanhara muitas vezes as conversas em que os avós da garota falavam sobre suas atividades – a personal trainner, natação, academia –, mas não imaginava que as mudanças fossem tantas, e tão acentuadas.

Seios fartos, cabelos sedosos, corpo cheio de curvas... Sem dúvida, era impossível olhar para ela e não desejá-la. “Mas não é só isso: daria a minha vida por ela, se fosse preciso!”, pensou Cássio, estremecendo com a força dessa decisão.
Sim, não se tratava apenas de desejo físico – o que sentia pela garota era muito mais forte e profundo. Percebeu então, com assombro, que estava completamente apaixonado pela filha do patrão!

Despreocupada por saber que a filha estava sendo bem cuidada, Sandra preparou-se para a reunião que estava marcada para o final daquela tarde, em Milão. Depois de passar pelo salão de beleza do hotel, para rápida ajeitada nos cabelos e unhas, percebeu no espelho o resultado e gostou do que viu.

Aos 37 anos, cabelos negros como os da filha, olhos azuis e amendoados – herança dos avós espanhóis – , sua ascendência moura podia ser confirmada na pele de pêssego, que se tornava acobreada à menor exposição ao sol. Sim, ainda era uma mulher bonita. Apesar de ter passado pelos dissabores da separação, não se julgava sem qualidades para atrair um homem – mesmo que o marido a tivesse trocado por uma prostituta.

“Com certeza, ela deve saber de truques que desconheço para satisfazer um homem na cama. Mas garanto que nunca vai se entregar a Alfredo com o amor e carinho que eu dediquei a ele”, murmurou Sandra para a imagem no espelho, enquanto uma sombra de tristeza toldava seus olhos.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Capítulo III (parte 4)

Alice, por sua vez, aproveitando que Cibele permanecia com os olhos fechados, como se estivesse dormitando, voltou sua mente para o jovem argentino que encontrara no Masp, poucos dias antes, quando foi com Paula ver uma exposição itinerante que estava sendo apresentada pelo museu. O riso fácil do artista, que ela soube depois ser um talentoso pintor, atraiu de imediato sua atenção.

Entretanto, o jeito desdenhoso como ele tratava as pessoas à sua volta lhe provocou “um quê” de aversão. Alto, loiro, porte atlético, bem vestido, seus olhos verdes dardejavam ironia quando o rapaz se voltou. E então, por uma fração de segundos, eles se encararam e ela soube, de imediato, que seus destinos estavam se cruzando.

Entre temerosa e surpresa, Alice não soube o que fazer: se sair correndo do museu, deixando para traz aquele rapaz que, com certeza, lhe traria muitos aborrecimentos, ou continuar enfrentando o olhar de seu antagonista, mostrando uma coragem que estava longe de sentir.

Às vezes, comentava com a mãe as estranhas impressões que sentia sobre certas pessoas. Mesmo não conhecendo muitas delas, podia dizer com facilidade quais as profissões que exerciam, seus gostos e preferências, pensamentos alegres ou tristes que, porventura, estivessem abrigando em suas mentes. Sandra lhe explicara que isso era chamado de sensitividade, intuição ou mediunidade, dependendo da linha filosófica em que as pessoas acreditavam.

Daí lhe vinha, então, a certeza absoluta de que o jovem artista e ela estavam irremediavelmente enredados – mesmo que não soubesse, naquele momento, em que tramas do destino teriam um papel a desempenhar.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Capítulo III (parte 3)

Mesmo não se rebelando contra as determinações impostas por Sandra e Josephine, as garotas levavam uma vida normal, com algumas visitas ao shopping, festas nas casas das amigas, passeios com a turma do colégio. Mas as restrições se estendiam a baladas, noites dormidas fora de casa, bem como aos namoricos em época de aula. “Há tempo para tudo nesta vida, minha querida”, não se cansava de lembrar a mãe de Cibele, que conhecera o marido quando tinha 24 anos de idade, e se casara quatro anos depois. Assim, quando a filha nasceu, Josephine se achava preparada para recebê-la e se tornar uma mãe dedicada.

Mas, como os tempos eram outros, as garotas não deixavam de observar os colegas de escola e os jovens que encontravam nas festas que freqüentavam. E era sobre um rapaz que conversavam, à beira da piscina, enquanto saboreavam o suco de uvas frescas que vovó Esmeralda acabara de fazer. “Você viu só os músculos dos braços dele? E aquela pele bronzeada, parecendo chocolate ao leite?”, admirava-se Alice, referindo-se a Cássio, que não viam desde seis meses antes, quando estiveram ali durante as férias de dezembro. “Menina, ele está cada vez mais gatésimo...”

Cibele riu do entusiasmo da amiga, mas não pôde deixar de concordar: os traços de Cássio parece que estavam melhor definidos, e seu rosto másculo realmente a fizera pensar em como seria estar abrigada entre seus braços. Sentiu um friozinho subir pela espinha ao imaginar o toque daquelas mãos em sua pele.

Sabia que o interesse de Alice não era profundo, e que ela só comentara o que não podia passar despercebido: Cássio era, sem dúvida, um belo homem. A pele saudável resultante da vida ao ar livre, a simplicidade dos trajes – apesar do indiscutível bom gosto na escolha das peças e na combinação de cores – , a segurança na condução dos negócios da fazenda, tudo nele exalava respeito e distinção.

Foi pelo pai, que confiava de forma absoluta no rapaz, que conheceu sua vida difícil, com conquistas obtidas a duras penas. Sua origem humilde não o desmerecia a seus olhos; ao contrário, mostrava como era determinado e persistente na realização de seus objetivos.

E um meio sorriso bailou em seus lábios, quando pensou como os pais e os avós reagiriam ao saber de seu interesse por Cássio. Mas, por ora, resolveu que nem a Alice contaria sobre as emoções que a envolviam, fazendo seu coração bater mais rápido e sua respiração se tornar mais ofegante quando pensava no rapaz.

Não, primeiro ia deixar seus sentimentos se definirem mais claramente; então, sim, abriria seu coração para aqueles a quem amava tão profundamente. Enquanto isso, já estabelecia pequenos planos para se aproximar do administrador da fazenda no decorrer daquelas férias.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Capítulo III (parte 2)

Enquanto as garotas se preparavam para viajar, arrumando as malas no quarto ao lado, Josephine estava sentada em confortável poltrona ao lado da janela, com um livro aberto esquecido sobre o colo. Pensava como, antigamente, eram bons aqueles momentos que precediam as idas para a fazenda: Cibele correndo de um lado para o outro, querendo colocar dentro da mala mais do que o necessário para os dias que passariam lá; Alceu recomendando que não se esquecesse das compras especiais que fizera para os pais; ela separando as roupas leves e confortáveis que a faziam se sentir tão bem quando desfrutava aquele ambiente tão simples e natural.

Sim, era uma pena que essas visitas, agora, fizessem parte apenas de seu passado. Não podia negar que ainda era apaixonada por Alceu, o que não facilitava em nada qualquer tentativa de começar um novo relacionamento – que ela nem sequer procurava ou desejava.

Como diziam sua avó e sua mãe, ela também sentia que um grande amor era para toda a vida. E o seu amor por Alceu ainda estava muito vivo em seu coração, em sua alma. Por isso, muito bem escondida de todos, Josephine ainda guardava a esperança de que o marido voltasse para ela.

Tão logo chegou a Milão, Sandra ligou para a filha, querendo saber se elas já estavam instaladas na fazenda. “Mãe, pode ficar descansada: vovô Márcio e vovó Esmeralda prepararam um banquete para nós. Falei para a Cibele que, se a gente não se cuidar, não vai ter academia que dê jeito no excesso de peso”, riu a garota divertida, pois a primeira preocupação de sua mãe, também, era que ela estivesse bem alimentada.

“Vamos ficar no quarto rosa, pois a Cibele prefere estar de frente para a piscina; assim, se a noite estiver muito quente, podemos nos refrescar sem molhar a casa toda”, comentou Alice, lembrando a mãe da vez anterior em que estiveram ali. Como ela e a amiga ficaram do outro lado do corredor, acabaram encharcando o tapete da sala de estar ao sair da piscina, sem toalha, e atravessar o aposento e parte do corredor até atingir o quarto azul.

Confortável e espaçosa, a casa principal da fazenda tinha oito amplas suítes (cada uma pintada em cor diferente, o que lhes dava os nomes), para os moradores e hóspedes, além dos quartos menores para os empregados. Apesar disso, Cibele e Alice gostavam de ficar sempre juntas, dividindo os mesmos aposentos. Aproveitavam para conversar até de madrugada: falavam de suas vidas e comentavam sobre seus sonhos, projetos e paqueras. Outras vezes, assistiam a filmes que não seriam aprovados por suas mães, mas que eram recomendados pelas colegas do colégio.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Capiítulo III (parte 1)

Capítulo III

Finalizadas as provas de junho, e tendo obtido ótima avaliação em todas as matérias, Cibele resolveu aproveitar o momento e pedir à mãe que a liberasse para passar mais tempo com os avós nas férias de julho. “Vamos, mamãe, não seja tão intransigente. Como a mãe da Alice vai viajar para Milão a trabalho, e ela vai ficar sozinha mesmo, podemos ir juntas para a fazenda. Então, o que me diz?”, insistiu a garota.

Considerando que a filha satisfazia as suas determinações sem contestar, pareceu a Josephine que ela merecia também uma concessão. Por isso, simplesmente observou: “Mas não se esqueça de guardar a devida distância daquela pessoa... você sabe quem”, completou, negando-se a sequer mencionar o nome da amásia do marido.

Depois de ter se separado de Alfredo – mesmo considerando que não precisava de outros recursos, uma vez que o ex-marido se mostrou bem generoso quanto à pensão que dava à filha –, Sandra voltara a desenhar e confeccionar bijuterias. Mas seu trabalho mostrava tão bom gosto, e as peças eram tão delicadas, que ela acabou atraindo a atenção de joalheiros nacionais e internacionais. Assim, quando começou a atuar como designer de jóias, constantemente viajava para o lançamento de suas coleções, que atraíam ricos e famosos de todo o mundo.

Essa era a razão de sua próxima viagem a Milão, para a qual pretendia levar também a filha. Entretanto, Alice fora categórica: “Prefiro ir para a fazenda dos avós da Cibele, mãe. Você vai estar ocupada com seus compromissos profissionais, e vou ter de ficar aguardando suas folgas de agenda para poder sair do hotel. Nem pensar... Na Pingo de Ouro, pelo menos, a gente tem o que fazer o tempo todo”.

Sem argumentos para demover a filha de sua decisão, Sandra teve de concordar. Afinal, melhor que ficasse mesmo com a amiga, já que na fazenda haveria menos motivos para se preocupar com sua segurança e conforto. Conhecendo o sr. Márcio e dona Esmeralda já há algum tempo, sabia que Alice ficaria em boas mãos.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Capítulo II (parte 6)

Quando chegou ao escritório de Alceu em busca de uma vaga de atendente, Cláudia não imaginava que sua vida pudesse mudar tão radicalmente. Morando nos confins da Zona Leste de São Paulo – a poucos quilômetros de outro município –, se conseguisse o emprego teria de madrugar para sair de casa, já que pegar ônibus e metrô estava fora de suas cogitações. Economizando o vale-transporte do metrô, que sabia que o advogado daria, pensava utilizar o dinheiro para as compras que fazia no mercadinho perto de sua casa. Mas, acima de tudo, o que pretendia mesmo era usar esse emprego como uma escada, a fim de conseguir “um trouxa pra pagar as contas”.

Assim, foi mesmo de caso pensado que começou a se insinuar para o seu empregador e, em breve, deixou de ser simples atendente para se tornar a secretária do dr. Alceu. Daí, para a cama de motel, não demorou quase nada. E, conseguir que o advogado deixasse a família para ficar com ela, foi mesmo brincadeira de criança, como Cláudia não se cansava de contar para as amigas.

Mas, comparados aos seus 22 anos, os quase 50 anos de Alceu (49, para ser exato) eram demais. O sexo agora tranqüilo, sem os arroubos de paixão dos primeiros tempos, começava a entediá-la. E ao conhecer Cássio, o administrador da Fazenda Pingo de Ouro, sua libido voltou a sinalizar com a necessidade ninfomaníaca que sentia de transar.

Foi por isso que passou a visitar a fazenda cada vez mais assiduamente, com o pretexto de trazer documentos para o rapaz assinar. Na verdade, eram esses encontros (já então sexuais) que lhe permitiam suportar “o água morna do Alceu”, sempre mais e mais irritante.

Cássio, o capataz-administrador, era filho de colonos de uma fazenda e, a duras penas, conseguira terminar o Colegial – caminhava 10 km para ir à escola e mais 10 km para voltar à casa dos pais, todos os dias. O dono da propriedade, reconhecendo os esforços do rapaz, o ajudou a prosseguir nos estudos; assim, ele conseguiu terminar o curso superior de Administração. E, quando Alceu comentou com um cliente (o patrão dos pais de Cássio) que precisava de um empregado de confiança, este lhe indicou o jovem administrador.

Aos 25 anos, cheio de saúde e energia, não foi sem relutância que Cássio cedeu ao assédio constante de Cláudia. Primeiro, foram as roupas sensuais e os olhares provocantes, mesmo quando o advogado estava por perto. Depois, vieram as palavras sussurradas ao pé do ouvido e os toques suaves de suas mãos, que acabaram por enlouquecê-lo e lhe tirar qualquer resquício de razão.

Apesar dos momentos apaixonados que estavam vivendo nos últimos meses, a situação não deixava de atormentá-lo, pois Alceu continuava a tratá-lo com consideração e respeito, sem desconfiar de nada. Contudo, não podia dizer o mesmo dos pais de seu patrão, que lhe lançavam olhares inquisitivos sempre que ele se despedia de Cláudia à porta da casa principal.

domingo, 11 de abril de 2010

Capítulo II (parte 5)

Enquanto isso acontecia na cidade, os pais de Alceu conversavam na varanda da casa principal, na Pingo de Ouro, sobre as muitas visitas que Cláudia agora fazia à fazenda, sem a companhia de seu filho.

“Não sei, não, meu velho, mas não me agrada ter essa moça rondando sempre por aqui, a pretexto de trazer documentos para o Cássio”, comentava dona Esmeralda, enquanto o sr. Márcio balançava a cabeça concordando com a esposa.

“Antes, os malotes semanais davam conta de levar a correspondência da fazenda para o escritório de Alceu e trazer o que nosso filho precisava enviar ao Cássio. Então, de uma hora pra outra, tem papel pra assinar que não acaba mais... e tudo urgente, urgente! Isso não está me cheirando nada bem”, ponderou o antigo mestre-de-obras.

Mesmo que lhes faltasse o estudo acadêmico, a vida ensinara àquelas pessoas simples que bom senso e discernimento lhes indicava uma direção segura por onde conduzir sua existência. Apesar dos poucos recursos advindos do salário do sr. Márcio, como mestre-de-obras, e das costuras que dona Esmeralda fazia para a vizinhança da periferia onde moravam, nada lhes faltara em casa e, na economia das despesas do dia-a-dia, guardavam ainda o suficiente para auxiliar Alceu, enquanto ele cursava a faculdade.

Por isso, quando o filho se formou, eles também se sentiram recompensados pelos esforços conjuntos. E Alceu não os decepcionara, aplicando-se como estagiário e, em bem pouco tempo, como funcionário de um escritório dos mais conceituados na cidade de São Paulo.

Foi nesse local que conheceu Josephine, filha do sócio majoritário do escritório advocatício. Antes mesmo de se darem conta, estavam tão enamorados que o pai da moça só pôde mesmo, em reconhecimento também à capacidade profissional do rapaz, partilhar com ele a sociedade e aceitá-lo como genro.

Com a morte do sogro e de seus dois sócios, Alceu se tornou proprietário do negócio, uma vez que os outros herdeiros lhe venderam suas partes, tendo em vista que não se interessavam pelo escritório. Então, com seu jeito objetivo de conduzir os processos, foi amealhando resultados positivos em suas ações, o que acabou angariando mais e mais clientes, com lucros sempre crescentes para o advogado.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Capítulo II (parte 4)

Fosse um pouco mais informado sobre a utilização de magia, Alfredo saberia que sua falta de vitalidade ao rebater às absurdas exigências de Valéria, bem como a impossibilidade de que se achava acometido de negar-lhe algum de seus pedidos, por mais estapafúrdio que lhe parecesse, só denotavam o entorpecimento de sua vontade.
Pois foi assim mesmo que a amante “o agarrou”: dobrando sua vontade à custa de um trabalho de amarração. Ainda no hospital, Valéria vislumbrou as facilidades financeiras que um relacionamento com Alfredo poderiam lhe propiciar e, sem nenhum constrangimento, em uma de suas assíduas visitas, obteve alguns fios de cabelo do moço.

Isso foi o suficiente para que “seo” Jurandir, o pai-de-santo que há tempos ela freqüentava, providenciasse “um trabalhinho” a fim de prender em suas teias o incauto executivo. É bem verdade que, a princípio, ele resistira a suas investidas sensuais, mas, depois de “amarrado”, conseguir o que queria de Alfredo era como tirar doce de criança – mesmo que quisesse, ele nem saberia como lhe dizer “Não”.
Só que, ultimamente, a presença do executivo começava a incomodá-la: perdera a vitalidade que a atraíra nos primeiros encontros, seus olhos deixaram de fasciná-la e seu constante mau humor a aborrecia.

Isso tudo, sem contar que deixara de lhe dar todos os presentes que ela exigia, além de regular o dinheiro que lhe tomava para as despesas pessoais. Se continuasse desse jeito, teria de arranjar novo “financiador”, pois Alejandro, o artista argentino que tomara como amante, já começava a reclamar dos poucos recursos que ela lhe dava.
Também, com a pequena fortuna que vinha gastando para agradá-lo – levando-o a restaurantes caros, renovando seu guarda-roupa, pagando a academia que ambos freqüentavam, bem como cabeleireiros e tratamentos estéticos –, teria de arranjar alguém que tivesse muito dinheiro.

“É, está na hora de me descartar do Alfredo. Preciso de um verdadeiro milionário, e não de um pobre assalariado como esse coitado”, pensava ela, enquanto dirigia um carro importado, do ano, que o executivo transferira para seu nome.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Culinária afro-ameríndia


Angu da Terra


Ingredientes do angu: duas colheres (de sopa) de fubá, uma xícara de água fria, sal, alho e azeite de dendê;

Molho: 250g de miúdos de boi misturados (fígado, coração, rim etc.), tomate, cebola, cheiro-verde, pimenta, alho, sal, azeite de dendê e vinagre,

Complemento: uma banana da terra, açúcar, canela.

Preparo: colocar o fubá de molho na água fria. Refogar o alho e juntar o fubá e o sal, deixando cozinhar. Quando o angu estiver pronto, despejar numa tigela e reservar. Colocar os miúdos picados em sal e vinagre. Refogar o tomate, a cebola, o cheiro-verde, a pimenta, o alho, o sal (tudo previamente temperado com pouco vinagre), juntar os miúdos, colocar água e cozinhar. Quando estiver pronto, despejar sobre o angu. Em separado, cortar a banana em tiras e fritar até dourar ligeiramente. Passar as tiras em um pouco de açúcar com canela e enfeitar o angu. Servir em seguida.

Capítulo II (parte 3)

Ao chegar ao escritório, Alfredo andava cabisbaixo, sem nem sequer responder ao cumprimento de seus subordinados. A secretária lhe entregou os muitos recados deixados pela ex-esposa no dia anterior, mas ele depositou os papéis sobre a mesa sem nem mesmo olhá-los. Recostou-se no alto espaldar da cadeira e passou as mãos pelo rosto cansado.

Como poderia suportar aquilo tudo que estava acontecendo com ele? Por que não se sentia com forças para reagir e dar nova direção à sua vida?
Desde que abandonara a esposa e a filha para ir viver com Valéria, parece que havia perdido o controle das coisas. Seu salário – um dos maiores daquela empresa multinacional, já que respondia pela Diretoria Financeira – já não estava sendo suficiente para pagar todas as despesas.

Antes, conseguia guardar boa parte do que ganhava, mesmo dando um padrão de vida muito bom para Sandra e Alice. Moravam em casa própria, com piscina, no bairro do Sumaré, em região considerada das mais valorizadas da cidade. Tinham sempre na garagem dois carros do ano, importados, e nas férias podia proporcionar à família viagens pelo Brasil e ao Exterior.

Agora, com os caros “mimos” que a amante lhe arrancava – novas jóias todas as semanas, roupas de grifes famosas e rápidas viagens aos locais turísticos considerados “in” no Brasil –, as economias de longos anos se esvaíram num piscar de olhos.

Até os recursos que reservara para os estudos da filha haviam sido consumidos pela avidez de Valéria. E o pior de tudo isso é que ele não conseguia lhe dizer “Não”, mesmo discordando de suas extravagâncias. “Se acreditasse no sobrenatural, até pensaria que fui enfeitiçado por ela”, pensou, para logo em seguida sorrir tristemente ante o que julgou ser um devaneio descabido.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Florais Flores da Terra

Meus amigos sabem que sou adepta das terapias naturais há muito tempo - desde antes mesmo de trabalhar na revista Planeta, onde apurei essa minha preferência não apenas entrevistando terapeutas expoentes em suas áreas de atuação, mas também frequentando diversos cursos.

Hoje, atuando também como massoterapeuta, dentre outras opções utilizo o Sistema Floral "Flores da Terra", que foi sistematizado pela farmacêutica e terapeuta natural Maria de Fátima Fernandes, que mora em Minas Gerais. Como parte da família dela mora em Itanhaém, foi aqui no Litoral que nos encontramos pela primeira vez, em 2005, e foi aqui mesmo que aprendi a usar os florais em meus trabalhos.

Apesar de a Fátima ter me ensinado a dinamizar as fórmulas a partir de tinturas-mãe que ela elabora no local mesmo em que as flores foram colhidas (em seu habitat natural), me adaptei melhor usando os florais no creme de massagem que utilizo para cada um de meus clientes.

Assim, vou explicar a vocês quais as essências florais que a Fátima sistematizou, bem como o uso que se faz delas como "Flores da Terra" - vale lembrar que a atuação de suas energias sutis ocorre nos nossos corpos etérico, astral, emocional, mental (o que acaba se refletindo em nosso organismo físico também).

E, para começar, vamos falar da flor do Abacateiro, que combate a rigidez, ajuda a promover o desprendimento de conceitos antigos e transforma padrões de hierarquia social. Ensina ainda a enxergar com os olhos da alma, bem como auxilia na queima de arquivo akáshico (cármico) e na transformação de padrões vibratórios.

Capítulo II (parte 2)

- Parece que você se esqueceu de muitos preceitos que seguiu quando vivia em comunidade, e que me ensinou quando veio morar comigo. Um deles dizia para ajudarmos a quem precisa, sem esperar retorno pelo nosso auxílio.
E Sandra foi obrigada a concordar com o marido, mas não podia negar aquela sensação de incômodo que teimava em se manifestar bem no seu íntimo.
Com a internação de Valéria – motivada pela grande debilidade orgânica que a vitimara, resultado de uma vida desregrada e pouco farta quanto à alimentação –, Alfredo passou a dar assistência à moça, e muitas vezes passava pelo hospital antes de regressar a sua casa, depois do trabalho. Os grandes olhos verdes de Valéria muitas vezes o prendiam mais do que gostaria de se demorar ali, mas acabava cedendo aos seus apelos porque só assim conseguia ver um pálido sorriso no rosto da socorrida.
Foram quase três semanas de visitas diárias, que criaram um laço de carinho muito especial entre o salvador e sua protegida. Ao deixar o hospital, Valéria foi para um pequeno apartamento alugado por Alfredo, já que, na noite em que foi socorrida, havia sido expulsa do local onde morava pelo seu cafetão.
Custeada pelo executivo, ela acabou deixando de praticar o metiê, e logo em seguida se tornaram amantes.

Recordando todos aqueles momentos sofridos, quando teve de encarar que perdera o marido para uma prostituta, Sandra principiou a sentir remorso pela praga que lhe rogara, quando Alfredo deixou sua casa para ir viver com Valéria. Seu agora ex-marido havia alugado a cobertura num edifício recém-construído no bairro da Vila Madalena, pois a sujeitinha adorava “transitar no meio de artistas” – e ali, com certeza, pintores, escultores, poetas e escritores, dentre outros, havia às dúzias... Ela dissera, então, que a cabeça de Alfredo não seria grande o suficiente para carregar “os galhos” que a outra lhe arranjaria. E depois disso tudo não se passaram nem seis meses.